Thursday, August 26, 2021
A élite no banco dos réus 2
A élite no banco dos réus 1
Sunday, August 22, 2021
O COLONIALISMO É AINDA UM TREMENDO SUCESSO
O diagrama aqui proposto é uma possível ilustração
da economia de Moçambique no período histórico que vai de 1850 a 2021,
revelando que, de facto, O COLONIALISMO É AINDA UM TREMENDO SUCESSO.
Se dúvidas ainda tivesse sobre o macabro e
tremendo sucesso do colonialismo, reconsidere o seu espanto ao ler estas linhas
ou, caso contrário, considere a facilidade com que concorda com as mesmas. Essa
é uma das mais interessantes provas do sucesso do colonialismo, pelo menos em
Moçambique.
Por colonialismo entendemos o esforço deliberado e
coordenado de um determinado Estado ou grupo de Estados de controlar as acções
de povos de outros territórios geográficos, de modo a expandir e preservar o
seu poder. O colonialismo é intrínseco à economia.
O resultado esperado é que a economia do
colonizador floresça e se desenvolva e a do colonizado, embora possa ser crível
que também se espere que floresça, ela nunca será desenvolvida, pela própria
natureza da relação entre as duas economias.
No caso de Moçambique, o colonialismo sustenta-se
do dualismo da sociedade, por si implantado deliberadamente, e que, não
obstante a proclamação da independência em 1975, o fenómeno sobrevive, volvidos
46 anos: “no território geográfico hoje conhecido por Moçambique existiram, no tempo colonial, pelo menos duas camadas sociais – uma subalterna e
outra superior ou dominante – cujo relacionamento é marcado quer pelo facto de
a camada superior deter o poder de regular o acesso às esferas situadas no
âmbito de seu controle quer pela existência de algum tipo de barreira, que
mantém a natureza hierárquica da situação.” (Cabaço, 2010).
Os recursos de
Moçambique são, em termos líquidos, drenados
para a chamada economia-mundo, assim
como para o chamado Moçambique das élites, pois este não só representa os seus
próprios interesses, como assume no território nacional o papel de guardião dos
interesses da economia-mundo.
A função dos membros do Moçambique das élites é, pura e simplesmente,
garantir a extracção dos recursos da economia do Moçambique subalterno para a economia-mundo, assim como para si
próprios. O Moçambique das élites é, em si, uma economia exclusiva e próspera
dentro do território geográfico de Moçambique. Não interessa, por enquanto, discutir
se essa prosperidade é ou não é sustentável a longo prazo, dadas as bases
económicas em que assenta.
O que interessa, neste momento, é chamar a atenção para o facto de que não
devemos encarar o Moçambique subalterno e o das élites como sendo uma entidade
única e una. A relação entre estas duas economias é a seguinte: o Moçambique
das élites detém poder absoluto sobre o Moçambique subalterno. Este (o
Moçambique subalterno), por sua vez, acredita piamente que é representado pelo Moçambique
das élites, e dele depende sem questionar.
Na realidade, nem o Moçambique subalterno nem o Moçambique das élites têm
sido estudados de uma forma autonomizada. O Moçambique subalterno tem sido empobrecido,
a ponto de ser já pobre, sim, por causa da pilhagem realizada pela economia-mundo,
cujos interesses são administrados e garantidos pelo Moçambique das élites.
Contudo, os indicadores económicos e sociais geralmente apresentados do
Moçambique subalterno, são ligeiramente melhores do que aqueles que deveriam
ser calculados com base na realidade ainda por identificar, dada a contribuição
positiva do Moçambique das élites que, como sabemos, é muito rico e próspero.
O Moçambique das élites é, por sua vez, e conforme referi anteriormente, uma
economia próspera, do primeiro mundo, e não interessa discutir aqui a justeza
ou não dessa prosperidade. É simplesmente um facto. Mas se for analisado em
conjunto com o Moçambique subalterno, os seus indicadores económicos e sociais
serão muito baixos, por causa da grande contribuição “negativa” do Moçambique
subalterno que, como mencionei, está empobrecido, por não poder participar de
forma activa na criação e apropriação da riqueza que os recursos existentes no
seu território económico permitiriam.
A tendência geral tem sido a de não autonomizar as economias do Moçambique
subalterno e dos das élites, o que leva a que se desperdice energia e tempo a
acusar de corrupção e má gestão aos membros da economia do Moçambique das élites.
Na verdade, a única acusação que se pode formular é a de serem uma economia
parasitária, que vive do roubo e do atraso planificado e intencional da
economia do Moçambique subalterno, a exemplo do que sucedia no período de
ocupação colonial. Isso parece-me ligeiramente diferente de “corrupção”. A
nossa miopia intelectual manifesta-se
sobretudo quando exigimos “desenvolvimento” precisamente a quem a não pode e
nem quer dar.
Já na economia do Moçambique subalterno podemos, sim, falar de “corrupção”,
uma corrupção crónica que tanto pode ser endógena quanto exógena,
propositadamente fomentada pela economia do Moçambique das élites, no âmbito
das suas estratégias de acumulação. Há, entre os membros da economia do
Moçambique subalterno, a percepção de que o melhor caminho é fazer parte da
economia do Moçambique das élites, o que não só fortalece a posição dos membros
da economia do Moçambique das élites, mas sobretudo agrava a situação da
economia do Moçambique subalterno e, por conseguinte, a economia de Moçambique
no seu todo.
É, portanto, no contexto desta realidade que acredito que devemos interpretar
as sucessivas tentativas de proposta de lei da Assembleia da República de
Moçambique, leis essas que “parecem” ferir a dignidade da maioria dos
moçambicanos, assim como as decisões de empresas públicas como a Electricidade
de Moçambique (EDM) que se acham com poder para adoptar câmbios diferentes
daqueles que estão em vigor no país.
O Moçambique das élites e o Moçambique subalterno ainda não se encontraram
na Constituição da República de Moçambique para, através dela, dialogarem. O
primeiro abusa-a sem escrúpulos, o segundo nem sequer sabe que ela existe, o
que dá muito jeito ao primeiro. O subsídio de atavio é apenas um exemplo de
encontro fortuito entre os dois moçambiques, ficando claro que, para colaborar
directamente com os membros do Moçambique das élites, os membros do Moçambique
subalterno deverão vestir-se à altura do Moçambique das élites, tal é a
discrepância social entre as duas realidades.
Teodósio Bule
Matola, 15 de Maio de 2021