Friday, April 11, 2025

 

SEIS LIÇÕES VALIOSAS QUE PODEMOS APRENDER DA ECONOMIA INTERNACIONAL (TEORIA E POLÍTICA):

 POR Teodósio Bule

1.      Comércio livre ou livre comércio (free trade) pode incrementar a eficiência económica agregada e o bem-estar económico agregado;

2.      Algumas pessoas irão sofrer perdas com o comércio livre;

3.      Por causa das chamadas vantagens comparativas, o comércio livre irá beneficiar alguns países, mesmo que estes sejam menos eficientes que todos outros países em todas indústrias;

4.      Uma empresa doméstica poderá perder na concorrência internacional mesmo que ela tenha os custos de produção mais baixos do mundo, ou seja, mesmo que ela tenha vantagens absolutas;

5.      O proteccionismo poderá ser benéfico para alguns países;

6.      Embora o proteccionismo possa ser benéfico, a ideia de comércio livre mantém-se apelativa.


Bónus para orientar nosso entendimento dos acontecimentos recentes:

1.      Importante não esquecer a Teoria de Heckscher-Ohlin e o Paradoxo de Leontief;

2.      Entender a importância da distinção do conceito de ``cadeia de suprimentos`` (``supply chain``) com o de ``cadeia de valor`` (``value chain``); e,

3.      Manter sempre presente que a actividade de política económica é uma actividade prática, cuja meta é obter determinados resultados; e a escolha dos objectivos da política económica é, não obstante, uma decisão política, que não se reduz a uma escolha puramente científica ou a um mero cálculo técnico. Ou seja, o Governo reserva-se o direito de escolher os seus objectivos de política económica sem ter em consideração a componente científica para o seu alcance.

Teodósio Bule

Matola, 11 de Abril de 2025

Monday, April 07, 2025

 

PRÁTICAS DE GOVERNAÇÃO

 POR Teodósio Bule

Os mais recentes desenvolvimentos políticos do meu país levam-me hoje a revisitar meus apontamentos de 2015, sobre práticas de governação, um tema que tem finalmente merecido a atenção de todos moçambicanos, incluindo crianças e velhos, e que é devidamente estudado e divulgado pelo IOG – Institute on Governance, do Canadá, minha fonte principal.

Como todos sabemos, os governos são das mais complexas organizações que há, que lidam com os assuntos dos mais complexos que há. E boa governação conduz a boas lideranças, boas decisões e bons resultados.

Mas estamos, neste momento, numa encruzilhada, pois muito do que as sociedades já construíram poderá não mais adequar-se aos desafios actuais.

O texto é longo, mas acho que vale a leitura. Como diria o Prof. Roberto Tibana, leia se tiver tempo e vontade, não é obrigado. (risos).

Vamos ao que interessa. A primeira prática de governação que iremos abordar, a chamada governação simples, consiste no seguinte: uma pessoa (o rei, o monarca) toma as decisões e o povo paga impostos, para o funcionamento do reino. Nesta prática de governação, mais ninguém tem voz, pelo que o soberano não tem que prestar contas a ninguém. Ainda existe esta prática, tanto de forma explícita quanto implícita. E ainda há quem se espante com o atraso de algumas sociedades…

No outro extremo, está a chamada governação distribuída, que detalharemos na parte final do texto.

Vejamos então como as sociedades evoluíram da governação simples até à distribuída.

Em 1215, há 810 anos, portanto, é publicada a Magna Carta e, a partir deste marco histórico, um grupo de nobres ingleses começa a ter uma palavra a dizer nos processos de decisão, passando o rei a ter de prestar contas aos nobres. Nestes termos, o rei não mais podia tomar decisões sobre os impostos a cobrar sem o consentimento dos nobres.

Importa aqui abrir um parêntesis para lembrar o seguinte: quaisquer que sejam os impostos, embora sirvam supostamente para financiar a actividade do Estado na produção dos chamados bens públicos (aqueles bens que, não obstante serem  essenciais para a vida, o chamado sector privado da actividade económica não tem interesse em produzi-los), eles têm muitas desvantagens, pois reduzem a actividade económica, uma vez que aumentam o preço que o comprador paga pelos bens, reduzem o preço que o vendedor recebe pelos bens vendidos, e geram ineficiência social, ao reduzir os excedentes tanto dos consumidores quanto dos produtores, ou seja, geram o chamado `peso morto` ou `deadweight loss`, como diriam os anglófonos.

Por isso, ``pega a visão``, como diz o jovem humorista Valter Danone, para quando alguém estiver a falar de impostos.

A partir do século XIII, o sistema parlamentar começa a ganhar terreno, para incluir representantes eleitos, compostos por grandes latifundiários e homens ricos do meio urbano. Emergia assim a Câmara dos Comuns. O poder do Parlamento foi crescendo, até chegar ao ponto de determinar quem poderia ser rei na Inglaterra. James II é derrotado pelo Parlamento neste contexto, em 1688, perdendo seu trono para William. Os reis passam a ser monarcas constitucionais, passando a prestar contas à aristocracia e a uma pequena alta classe de cidadãos ricos.

Ao longo dos 200 anos seguintes, a voz do povo foi-se elevando, e a figura de primeiro-ministro emergiu como o verdadeiro chefe do governo, tendo os conselheiros do rei começado a assemelhar-se cada vez mais aos modernos conselhos de ministros.

Sucede que com o advento do novo mundo, surgem novas ideias sobre governação, tendo emergido nos Estados Unidos da América, em 1776, a ideia de que não deverá haver tributação sem a devida representação, uma vez que aquele país tinha uma forma democrática de governação baseada na representação directa. Mais uma vez, a questão dos impostos mostra-se relevante no curso dos acontecimentos.

Estava em curso a Revolução Industrial, que expandiu a sociedade urbana e uma crescente classe média educada. À medida que a economia crescia e a sociedade evoluía, exigia-se que os governos fizessem mais. Repito: exigia-se que os governos fizessem mais e não que se esperasse que os governos dissessem que vão fazer mais…

Na Alemanha, Bismarque introduziu um moderno Estado de bem-estar social, o chamado welfare State, nos anos 1880. Os trabalhadores passaram a ter uma palavra a dizer sobre a vida laboral; sua voz ouvia-se cada vez mais.

À medida que a natureza da governação se transformava, também se transformava a natureza dos governos, surgindo assim a burocracia profissional. O nepotismo e outros sistemas arcaicos foram sendo substituídos por serviços públicos imparciais e baseados no mérito. Bom, nem todas sociedades se dignaram transformar-se nestes termos, infelizmente: quando alguns governos se atrasam no pagamento de salários, famílias inteiras ficam aflitas…

O nepotismo também tem custos directos sobre os próprios perpetradores.

Em finais do século XIX, já estava bem enraizada a ideia de ``uma pessoa um voto``, e exigências para o sufrágio universal iam crescendo por toda parte. Estas tendências para processos de tomada de decisão mais inclusivos; uma voz mais audível do cidadão, sufrágio universal; e uma crescente prestação de contas do governo continuou ao longo da primeira metade do século XX: o governo prestava contas ao Parlamento e este era supremo.

Actualmente, uma série de factores determinam a forma do ambiente de governação: aumento do rendimento das famílias; aumento do nível de escolaridade; aumento das expectativas pessoais; revolução das tecnologias da informação; assim como a globalização. Cidadãos com mais conhecimentos, educação e riqueza querem dos seus governos prestações de contas mais rápidas e mais transparentes, e mostram-se menos deferentes diante de governos com o hábito de falar e decidir pelos cidadãos.

Com a complexidade social e económica (passe a redundância!) que se verifica actualmente, a forma de governo mudou: novas funções trazem novos arranjos institucionais (uma série de agências; comités de gestão; comissões; e corporações concebidas para assessorar, regular, adjudicar e prestar serviços). Suas relações com o governo e com os governados são multifacetadas e complexas. Este é o mundo da governação distribuída, que referimos nos primeiros parágrafos.

Daqui resulta a necessidade de uma assessoria devidamente qualificada para o sucesso da governação, através de uma orientação informada aos decisores políticos a agir ao longo das mudanças em marcha, no sentido de acharem a melhor maneira de prestarem serviços aos cidadãos e alcançarem os melhores resultados para os mesmos cidadãos.

Os desafios da governação incluem a representação efectiva da diversidade populacional; uma população maioritariamente jovem, no caso de Moçambique, mas também com problemas específicos relacionados com a terceira idade; redes de transportes; e prontidão para fazer face aos efeitos do clima. E tudo é agora mais acelerado: novas tecnologias fracturantes estão a criar e potenciar mudanças em tudo, desde a formulação de políticas até à prestação de serviços, passando pelo activismo dos cidadãos.

Termino referindo que à medida que as expectativas aumentam, o relacionamento entre governos e cidadãos também se vai alterando. Os desafios da governação incluem a renovação das noções de privacidade, confidencialidade, abertura e controlo dos dados do governo, e como incorporar o envolvimento directo dos cidadãos no período que decorre entre as eleições, enquanto se responde ao agora empoderado cidadão activista.

Matola, 7 de Abril de 2025
(10 anos depois)
                                                                                                                                                                            

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