Thursday, December 29, 2005

 

Para ti, Amina Lawal

De Teodósio, por um futuro melhor para a Wasila

Tudo o que se tem passado nada tem que ver com a cultura dos nossos ancestrais, quem quiser investigar um pouco mais descobrirá que é tudo importado. Daí a tua serenidade. Daí a minha estupefacção perante tamanha estupidez!


Amina, é pena que te conheça através da comunicação social e por razões que nos envergonham a ambos. É por isso que nos interessa, a ti e a mim, esclarecer que tudo o que se tem passado nada tem que ver com a cultura dos nossos ancestrais, quem quiser investigar um pouco mais descobrirá que é tudo importado. Daí a tua serenidade. Daí a minha estupefacção perante tamanha estupidez!

Vi-te ontem na televisão. A tua expressão parecia querer dizer: “se a asnice matasse, de certeza que, nesta sala, não sobrava senão minha filha e eu...”

Pouco sei sobre o teu julgamento, mas parece-me que se pode resumir do seguinte modo: tu estás divorciada mas engravidaste de um vizinho e nasceu a beldade que vi ontem na televisão, a Wasila. A “lei” religiosa, há pouco introduzida na tua região natal, assevera que qualquer relação amorosa fora do casamento constitui adultério, mesmo depois do divórcio. Pareceu-me também que tal “lei” só se aplica às mulheres. Aliás, creio ter lido que bastava que o pai da tua filha confirmasse a paternidade para tu não teres mais problemas com a “justiça”!...

Ora permite-me que te diga duas ou três palavras sobre o modo como nós lidamos com esse tipo de problema na outra margem de África, algures na zona austral.
Em primeiro lugar, não haveria problema para resolver, uma vez que és uma mulher livre, sem nenhum laço matrimonial com o teu anterior marido. Caso o teu actual companheiro não quisesse assumir a paternidade, o teu pai é que desempenharia esse papel, com toda a felicidade, pois a criança é a melhor das riquezas!

Em segundo lugar, caso fosses casada e cometesses adultério, a família do teu marido tudo faria para reunir provas contra o teu companheiro e ele é que teria uma avultadíssima multa a pagar! Tu só terias contas a prestar ao teu marido, no recesso do vosso lar! Não te garanto é que não levasses alguns tabefes, mas como sabes, quem anda à chuva está sujeito a molhar-se... A criança, essa, seria “obviamente” fruto do casamento, pelo que o prevaricador do teu amante só se quisesse meter-se em trabalhos é que reivindicaria a paternidade!

Por último, permite-me que te diga que esse assunto diz respeito apenas à tua família e não a nenhuma outra instituição. Acreditamos que uma família que não consiga resolver os seus problemas internos, dificilmente ganhará uma contenda que a oponha a uma qualquer outra família.

Termino, por hoje, Amina, na esperança de voltar a escrever-te em Fevereiro próximo, em que falaremos do amor, da liberdade, de quão crescida estará a tua filha. E tu, tu nessa altura terás esquecido o tormento por que tens passado e estarás a ensinar às outras mulheres dessa Nigéria querida os valores da fraternidade, da vida, a necessidade de reaprendermos a nossa História. Depois de leres a minha carta, receberás um beijo ternurento da Wasila, na certeza de que a África do amanhã merecerá o carinho de todas as Wasilas do mundo!

P.S: Já assinei a carta aberta ao Presidente Obasanjo, constante em http://www.mertonai.org/amina/


Carta inicialmente publicada em
www.africa-strategy.com, em 2002, por ocasião da condenação de Amina Lawal à morte por lapidação. A consumação do acto foi então marcada para Janeiro de 2003, mas felizmente não se concretizou.

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