Friday, June 23, 2006

 

Lixo é Luxo


POR Teodósio Bule

“Lixo é Luxo” é um prémio. É mais uma inovação no âmbito do concurso “Moçambique dá $orte”. O prémio é fabuloso, mas por uma questão de estratégia não é regular, o que levou à transformação radical do meio ambiente nas cidades de Maputo e Matola, onde o lixo doméstico se tornou, literalmente, objecto de ornamentação, digno de um lugar de destaque nas melhores salas de estar.

Provavelmente uma ideia de um Consultor estrangeiro, oriundo de um país ocidental, financiado por fundos doados ao nosso país pelos parceiros internacionais de cooperação, “Lixo é Luxo” é um prémio para aqueles que acumulem o lixo nas suas salas de estar, sem que tal perturbe o seu bem-estar. Por outras palavras, o prémio é para aqueles que façam do lixo um luxo.

Tudo passa por um arranjo nos números das cartelas sorteadas em algumas edições do concurso “Moçambique dá $orte”, em que os números das cartelas vencedoras do quinto ao primeiro prémios indicam, respectivamente o número da rua contemplada, o número do edifício, o número do andar (se for o caso), e o número do apartamento ou moradia, este último determinado pelo número da cartela vencedora do primeiro prémio.

Identificada a habitação vencedora, a equipa de produção do “Moçambique dá $orte” vai de imediato conferir se a casa em causa tem, na respectiva sala, ou noutra divisão condigna da casa, lixo acumulado durante um período de pelo menos uma semana, separado e acondicionado conforme as regras pré-estabelecidas, e de acordo com o agregado familiar respectivo.

Ora depois de várias semanas a espera da sorte, depois de perceber que passados três dias, um quilograma de casca de qualquer legume ou peça de fruta cabe numa embalagem pequena de manteiga, ou que os restos de peixe, devidamente lavados e enxutos não exalam o habitual mau cheiro, para além de saber que o ruído que se ouve da casa da minha vizinha não é o que a minha mente obscena imaginava, mas sim o som dum triturador de resíduos sólidos orgânicos, chegou a minha vez de ganhar o “Lixo é Luxo”: um tractor agrícola e uma carrinha de mercadorias.

O telemóvel toca. Aliás, emite aquela voz irritante e repetitiva: “são seis da manhã. Pula da cama, e vai trabalhar, malandro!”... Levantei-me e liguei a TV. As notícias são as de sempre. As pessoas queixam-se dos mesmos problemas, e continuam a apontar o dedo aos habituais alvos. O Consultor estrangeiro ainda não foi contratado, e alguns iluminados nacionais acham que, para manter as cidades limpas, os Conselhos Municipais deveriam comprar o lixo urbano. Haja paciência! TB

*imagem obtida em: sergeicartoons.blogs.sapo.pt
**artigo inicialmente publicado em TEOsofias, do semanario mundo9, ediçao de 13 a 20 de Junho de 2006.

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